domingo, 15 de janeiro de 2012

Quero Somente...

Quero na minha vida, a simplicidade de simplesmente ser!
Quero na minha vida, a simplicidade de ter em mim a emoção das lágrimas não partilhadas, por amar a beleza das pequenas coisas!
Quero na minha vida, a simplicidade de observar todos os dias o nascer do sol, maravilhando-me como se fosse a primeira vez!
Quero na minha vida, a simplicidade de escutar o cantar dos pássaros, encontrando nesses sons a mais bela melodia do universo! 
Quero na minha vida, a simplicidade de caminhar descalça na praia em dia de sueste, deixando toda a energia do mar revolto e do vento agreste, activar as células dos meu corpo, como se vida nova me fosse dada!
Quero na minha vida, a simplicidade de em cada por-do-sol, naquele momento mágico que antecede a noite, sentir em mim tudo o que foi... tudo o que é...
Quero na minha vida, a simplicidade do silêncio da intimidade partilhada na pureza das almas que percorreram um longo caminho, onde aprenderam a amar a serenidade de aceitar e aceitar-se!
Quero na minha vida, a simplicidade de amar o amor!

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Figueira ao luar




Fechar os olhos e ouvir…Ouvir a água do riacho numa alegre toada…Ouvir a dança do vento com as árvores… Ouvir os pássaros … Ouvir os lobos a uivar nas noites frias de Inverno…
Fechar os olhos… sentir… sentir-se…

Os anos haviam passado por ela, o rosto mostrava a beleza madura, acentuada pelas marcas do tempo. O olhar refletia o amor à vida, sentia-se realizada. Nada, nem ninguém a faria abandonar o jardim da sua casinha branca, perfeitamente enquadrada na paisagem da serra.
O jardim… Espelho daquele que fora seu companheiro, amante, amigo por mais de cinquenta anos.
Dentro de casa os livros, a musica. Fora, toda a vastidão da serra… E os sons… Os sons da natureza… O seu mundo de sentires. Nada mais precisava.

Naquela tarde, era véspera de finados. Sempre fora sua tradição fazer estrelas e queijo de figo. Apesar do seu homem, já não se encontrar fisicamente junto dela, cumpria o ritual em memória de tempos passados.
Sentada na varanda, balançou a cadeira, ao ritmo do bolero que ouvia através da janela aberta. No rosto desenhou-se um sorriso de felicidade, pintada de alguma nostalgia. Chegara-lhe ao nariz, o aroma doce das estrelas de figo, que torravam no velho forno de pão. Fechou os olhos e viajou no tempo.

Voltou aquele ano, quando fora uma jovem curtanheira que desceu a serra, para passar os meses de Julho e Agosto na apanha do figo.

Os dias foram passados com as outras raparigas a colher os figos, depois espalhados no almeixar para secar. Todas elas ansiavam pela noite, havia sempre bailarico nas eiras, após a ceia, divertiam-se esquecendo até do cansaço do dia de trabalho, ao sol abrasador do verão. Numa dessas noites quentes de lua cheia de Agosto, (quando os jovens casais se esgueiravam, para saciar os corpos famintos, debaixo das árvores, tendo por cama o restolho), eles viram-se pela primeira vez…! Ela, sentiu o sangue circular mais rápido, ficou com as pernas trémulas. Ele era diferente de todos os rapazes que alguma vez tinha visto… Sentiu as faces afogueadas, quando ele se aproximou, estendendo-lhe a mão, num convite irresistível. Os dedos tocaram-se, ele fixou-a dentro dos olhos, e… Ficaram presos desse olhar!
De mãos dadas seguiram, tendo por cúmplice a lua. Amaram-se debaixo da figueira centenária. Nessa e nas outras noites…
Terminada a época da apanha, ela voltou à aldeia na serra.
Passaram os meses…
No dia de finados desse mesmo ano, ele foi visitá-la, levando-lhe um cesto com estrelas e queijo de figo. Deram as mãos, sentaram-se lado a lado… selando assim o casamento, tendo por padrinhos os figos secos.

A cadeira de baloiço, parou suavemente. Envolta em sublime emoção nunca antes sentida percebeu que havia chegado a sua hora. Abriu os olhos…olhou em volta… sorriu…
Aquela mão tão amada estendeu-se novamente para ela… Fechou os olhos e foi… Partiu serena, tranquila, feliz. Afinal vivera de uma forma absoluta.