quinta-feira, 15 de julho de 2010

Delírio Efectivo

« A renuncia é a liberdade. Não querer é poder.»
 Fernando Pessoa 
                                  
Sendo a liberdade o conjunto de direitos e deveres reconhecidos ao individuo isoladamente ou em grupo em face da autoridade política e perante o Estado, podemos dizer que esse mesmo individuo exerce a sua vontade dentro dos limites que a lei lhe faculta. Ora perante esta pequena reflexão, chego à conclusão que ninguém é verdadeiramente livre, na medida em que a liberdade total também é uma forma de aprisionamento. Sempre que alguém pensa e se julga livre, está na realidade,  prisioneiro desse mesmo pensamento, porque a liberdade plena é uma utopia.


Às vezes repito para mim um pensamento que ouvi um dia “ eu tenho liberdade para fazer tudo, mas nem tudo me convém”, pois bem, nem tudo me convém porque eu não posso nunca esquecer-me que a minha liberdade, está sempre condicionada à liberdade do outro.  Se nós somos um ser social que vivemos em sociedade, estamos sempre condicionados pelas regras morais e sociais a ela inerentes. Eu não tenho o direito de afrontar, chocar eu magoar alguém, só porque me apetece fazer . Quando nós estamos centrados em nós mesmos e nem reparamos no que se passa com o próximo, transformamo-nos num Ser  egoísta, e o egoísmo é a maior forma de aprisionamento que qualquer criatura humano pode experimentar.

A primeira escola onde  aperfeiçoamos e educamos a nossa personalidade é a  família, é nela que aprendemos desde pequenos o que é certo ou errado, o que é bom ou mau, quais os nosso deveres e direitos.

A minha  liberdade depende um primeiro lugar de mim mesma, das concessões que eu me permito, e uma outra coisa que também  considero muito importante: a permissão que eu dou aos outros para interferir no meu espaço.

Quando as pessoas estão seguras do que de facto importa para o bem estar delas e dos outros, não impõe nada pela força nem pela violência, aceitam e tentam compreender a razão do outro, porque todo o ser humano tem o seu livre arbítrio e esse instrumento quando é usado com sabedoria, dá-nos a capacidade de nos sentirmos livres, porque a liberdade é também  um estado de alma.  

Para o Ser Humano poder exercer a sua liberdade com responsabilidade, talvez tivéssemos que reinventar novamente a própria natureza do Homem, pois se por um lado o Homem é um ser que necessita de viver um comunidade por todas as razões que nos são conhecidas, por outro lado quando chega a hora da partilha, da ajuda, do dar a mão ao outro que necessita, o de ser compreensivo com a dificuldade do outro,  ainda são muito poucos os que o conseguem fazer.

5 comentários:

Mena G disse...

Maria Madalena:
há muitos anos fiz um trabaho de escola em Filosofia subordinado ao tema Liberdade.
Usei um boneco do Quino (pai da Mafalda).
Um castelo em forma exagonal, um homem lá dentro com uma grande chave trancando-se por dentro.
E a legenda dele:
"Se eu tivesse a liberdade, fechava-me aqui com ela e não a dava a ninguém"...
:)Tá tudo dito!

Valquíria Calado disse...

Sim , e eu concordo com a amiga Mena G, a liberdade é relativa, diante de um mar enorme me sinto livre, mas não para atravessa-lo. beijos amiga.

piedadevieira disse...

Bela reflexão, Mada.
Para você:
"Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique, mas ninguém que não entenda." Clarice Lispector
Beijos

vieira calado disse...

Bem,

vejo que estás em férias...

bem merecidas,

aliás!

Beijinho

éf disse...

Cara Madalena estou em profundo desacordo contigo, portanto aqui vai, e começo logo com um breve poema produzido para esta resposta:

Falta-me dinheiro para ser livre.
Sem dinheiro que me dê autonomia
Nem critico o mal como gostaria.

E não é a liberdade do outro que condiciona a minha liberdade, mas sim opressão do outro, do filho da puta que tem o poder e o exerce (filho da puta é uma condição inerente ao exercício do poder). É isso que condiciona a minha liberdade. Claro está que o filho da puta inventou essa falácia que pretende postular que a minha liberdade acaba onde a do outro começa. Parvoíce, e puro jogo semântico.

«Se nós somos um ser social que vivemos em sociedade, estamos sempre condicionados pelas regras morais e sociais a ela inerentes.» Isso é uma assunção errada pois então nunca poderíamos mudar as regras morais da sociedade, e elas já mudaram tantas vezes, felizmente. A sociedade é um corpo vivo, dinâmico e mutável, talvez não tanto quanto gostaríamos, mas é.

«Eu não tenho o direito de afrontar, chocar eu magoar alguém, só porque me apetece fazer.»

Então a ARTE não tem razão de existir? Não posso ter o direito de afrontar, chocar eu magoar alguém, só porque me apetece fazer? Então o que é a ARTE? E eu conheço tantaspessoas que merecem/ necessitam ser afrontadas, chocadas e até magoadas.
E a crítica contundente, também não pode existir? Repara, eu recuso-me a respeitar quem pratica religiões, porque vejo nessas pessoas gente muito perigosa, gente cega capaz de se deixar levar para os maiores crimes em nome da religião e de Deus. Alguns dos maiores crimes da humanidade não foram praticados dessa forma? O que impede que voltem a acontecer? Claro que não posso respeitá-los. Puta que os pariu.

« A minha liberdade depende um primeiro lugar de mim mesma, das concessões que eu me permito, e uma outra coisa que também considero muito importante: a permissão que eu dou aos outros para interferir no meu espaço.» Madalena, a vida também é feita de transgressão. Horrorosa seria a vida tutelada, regida por um sistema permanente de permissões de interferência.

«Para o Ser Humano poder exercer a sua liberdade com responsabilidade, talvez tivéssemos que reinventar novamente a própria natureza do Homem,…» Não, bastava então dar alguma liberdade a essa natureza do Homem, que está demasiado espartilhada e condicionada.

« … quando chega a hora da partilha, da ajuda, do dar a mão ao outro que necessita, o de ser compreensivo com a dificuldade do outro, ainda são muito poucos os que o conseguem fazer….» Sempre assim foi, o egoísmo é uma característica natural enquanto que a solidariedade é uma construção civilizacional, logo cultural; pelo que será sempre mais difícil ajudar do que ignorar.

O resto fica para discutir num jantar. És umas das poucas pessoas com quem gosto de discutir estes assuntos e já faz tempo que não temos oportunidade.